Contos e desencantos
Por Marcos Vinicius
Pellegrini
Capítulo I – Saindo de casa
Atualizar
o status no facebook é uma tarefa árdua, mas pior que isso é ver esse direito
ser tirado das suas mãos quando seu namorado o faz repentinamente. Catarina
havia passado por vários momentos ruins em sua vida, entretanto nada se
comparava ao vazio que sentiu quando uma simples mensagem no seu perfil
explicava os motivos de seu atual ex. Rapidamente ela selecionou a
playlist mais emotiva que pode em seus vários gigabytes de música e chorou até seus
olhos incharem. Apesar de saber que as coisas nunca estiveram perfeitas, foi um
golpe duro demais ver tudo que ela tinha idealizado se desfazer num instante.
— Não deveria ter feito
de um idiota minha motivação... meu objetivo... minha vida.. Os pensamentos
de Catarina eram facilmente interrompidos por lembranças de como ela era feliz
e menina acabava chorando de forma desenfreada.
Com
muito custo Catarina achou refúgio no seu sono, infelizmente interrompido pelo
barulho de sua mãe batendo na porta de seu quarto aos berros:
— Dormindo ainda?!
Levanta, temos muito o que fazer!
As palavras de sua mãe ecoavam na cabeça da adolescente de dezesseis
anos, a vontade de responder de forma ríspida fazia seus dentes rangerem, mas
desde a morte de seu pai, Cristina se tornou uma de suas melhores amigas.
Levantou-se aos poucos, olhou-se no espelho e não gostou do que viu, entretanto
não se importou, afinal não queria agradar a ninguém. As caixas cheias de
coisas estavam em toda parte da casa, seu fiel notebook foi a única coisa não
embalada (além claro do seu celular). Cumprimentou sua mãe que lhe deu um
beijo cheio de ternura seguido da frase: Simplesmente
não era pra ser... Por um momento ela amaldiçoou o dia em que contaram para
sua mão sobre a tal rede social que todos estavam migrando, ter sua mãe sabendo
de tantas coisas era algo que lhe feria o orgulho, mas acalentava seu coração,
pois sabia que tinha com quem contar.
A capital paulistana deixaria de ser seu lar, uma proposta de
emprego irrecusável foi feita no interior do Rio de Janeiro para sua mãe, a
perda do Valter fez com que fossem obrigadas a fechar o negócio da família, um
restaurante pequeno, mas conhecidos por todos da redondeza. Valter era a alma
do Virada Paulista, o restaurante que se tornava uma verdadeira festa em dias
de jogos de futebol. Antes de entrar no carro um SMS chegou em seu telefone,
era Raisa, sua melhor amiga, o texto dizia:
Vc vai fazer mta falta minha
bonequinha... =(
Espero que dê td certo pra vc na nova
cidade.
Mas smp que puder vou ti ver, bjs miga
*.*
Quando Catarina ia responder sua mãe lhe pediu ajuda com as
malas. Deixando seu notebook no banco do carro, a menina ajudou em tudo que
podia, carregava malas pesadas para o porta malas do Gol amarelo de sua mãe.
Depois de revisar se não havia esquecido algo, entrou finalmente no carro;
relaxou um pouco enquanto o carro começava uma jornada de sete horas de viagem.
Ela via as casas passando, sua escola vazia naquele sábado, viu a rua onde
morava sua melhor amiga e por fim a casa do primo do seu ex. Lembrou-se por um
instante que ia naquela casa com certa freqüência e da primeira vez que beijou
seu ex. Uma tristeza mórbida tomou conta da jovem que se apressou em pegar seu
telefone para ouvir música, colocou seus fones de ouvido e viajou na melodia
que a animou um pouco. Depois de três músicas teve uma péssima notícia: Bateria
fraca. Horas de viagem sem música?! Eu
não mereço isso! Pensou a menina. Tentou responder o SMS da amiga mas era
tarde demais, com um “bye bye” quase irônico o telefone desligou obrigando-a
ouvir o que sua mãe escolheu para viagem: Roberto Carlos. Não entendia por que
alguém com uma voz quase comum pode ser considerado o rei da música brasileira,
entretanto a “estrada de santos” dominou sua mente e trouxe um pouco de
felicidade ao carro.
Catarina se acomodou no banco do carro e dormiu, eram cinco
horas da manhã e seu sono não foi dos melhores até então. Acordou com a voz de
sua mãe chamando, elas estavam num estacionamento de um restaurante.
— Onde estamos? Perguntou Catarina com uma voz rouca.
— Guaratinguetá. Vamos comer alguma coisa, nem café
tivemos tempo para tomar. Respondeu Cristina pegando sua bolsa.
Ambas entraram, ainda eram oito horas da manhã e o apetite de
Catarina não tinha acordado, então uma Ruffles com Coca-cola foi sua escolha.
Chegando a mesa recebeu um olhar de reprovação da sua mãe, mas ninguém disse
uma única palavra. Cristina enviava e-mails pelo telefone tomando seu cappuccino
e comendo um misto quente, o olhar de admiração por sua mãe era nítido no rosto
de Catarina. Ela pensou: Mesmo meu pai
sendo um homem tão bom, minha mãe seguiu sua vida. Quão mesquinha seria eu se
fizesse o contrário por um moleque. A pausa terminou e ambas voltaram ao
carro e continuaram a viajem. Passaram-se as horas e o sono não voltou a dar o
ar da graça para Catarina. Por volta da uma da tarde o calor era insuportável
no fim do mês de novembro, o carro não tinha ar condicionado, então Catarina
decidiu tirar sua blusa e pegar uma camisa mais leve. Por um instante ficou apenas de sutiã na parte de
cima de seu corpo, tempo suficiente para um rapaz que estava no carro ao lado da pista
admirar sua beleza. Com um movimento involuntário ela colocou os braços a
frente do sutiã e para sua sorte, uma outra menina vendou os olhos do rapaz com
as mãos, deu para perceber que o jovem levou uma bronca da menina que viajava
com ele, um sorriso brotou no rosto de Catarina enquanto os carros se afastavam
pois sua mãe estava apressada.
A viagem foi tranquila em sua sequência. Pedágios, mais um
restaurante, pequenas cidades e muita paisagem verde.Por fim, chegaram ao seu
destino quase as duas horas da tarde. Uma placa dizia “Bem vindos a Rio das
Ostras”, com desdenho ela imaginou o que não teria visto em São Paulo que essa
cidade poderia lhe mostrar.
Catarina não sabia mas ali sua vida iria mudar radicalmente,
ela sentia medo do novo, porém precisava dele. Uma única pessoa lhe faria falta
em São Paulo, nada mais a prendia aquela cidade. Haviam apenas lembranças ruins
e saudades que jamais seriam supridas.
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